Amor em Mão Única

Imagine um país, do qual as estradas só partem, do qual os carros se afastam até sumirem na fronteira. Imagine um porto em que navio nenhum atraca e os que de ali saem, foram ali mesmo construídos. Feitos para partirem. Imagine um país, para o qual ninguém volta, do qual todos os filhos mais jovens fogem, seduzidos pelo mundo distante.

Assim somos, estradas de mão única, mares que ofertam, lares decorados de paredes cheias de saudade. Assim somos enquanto amamos muito mais do que nos amam de volta, quando perdoamos sem perdão em troca, quando confundem nosso silêncio momentâneo, nosso respeito que escuta, nosso interesse que cuida, com a não necessidade de também dizer. Pode ser precipitado da parte dos outros pensar que temos tudo aquilo que oferecemos em abundância.

Então, imagine um país, com estradas que partem e voltam, em duas mãos. E depois um porto, de onde a curiosidade dos meninos e a saudade das moças possam acenar para os carregamentos que chegam. Imagine os filhos do amor que lançamos voltando, repatriando-se, repovoando a nossa fé. Mas nada disso ocorre. Nem estrada, nem porto, nem nenhum retorno. Não por hoje.

Mas amanhã, nosso amor, que tão ingenuamente aprendeu a se recompor, não fechará as fronteiras por onde jamais se entra. Nosso amor alargará as pistas e lançará dezenas de novos navios ao horizonte do mar. Nosso amor desenhará também com luzes uma pista de pouso, de onde, a princípio só se vai decolar. Um dia alguém há de ver toda uma frota partindo e vai querer saber onde aquela rota contínua vai parar. Um dia alguém descobre, no começo da estrada que parte da gente, um lar.

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