Trinta cartas para o perdão

Observando as ondas de Choroni, entendi que as arestas que deixei pela vida foram me puxando para trás, me impedindo de seguir. Me surpreendi ao perceber a quantidade imensa de pessoas com quem não falava mais, nomes desenhados na areia que o mar não podia levar.

Meu trajeto na rua estava ficando complexo. Eram muitas calçadas para desviar. Listei todas elas. Trinta. Parece muito, mas acredite: a gente não tem noção da quantidade de pessoas que tentamos apagar como se a vida aceitasse uma demão de errorex sobre suas linhas.

Escrevi trinta cartas, pedindo e trocando perdão. No começo foi difícil como abrir os olhos na ventania. Mas pedir perdão é um exercício de se libertar. A cada nova carta, a cada nova resposta, meu coração se reconstruía. Pedi perdão para meu melhor amigo, pedi perdão para alguém que mal conhecia, pedi perdão por meus maus pensamentos, pedi perdão para quem mais feri na vida: a mim mesmo.

Só quando tentei sair, notei que havia construído uma imensa barragem à minha volta, com centenas de metros de paredes espessas. Ao pedir perdão para a primeira pessoa, foi como romper uma pequena fenda de passagem. Bastava aquele pequeno espaço de ar para que a força do outro lado começasse a se esforçar para sair. O bem também tem uma força incontrolável, quando provocado. Bastou isto, este pequeno impulso, para libertar o rio gigantesco do meu coração.

Esta é a minha trigésima carta para o perdão. Quando brigamos há alguns anos, eu lhe disse coisas terríveis. Perdoe aquele garoto com hormônios demais e estrada de menos. Hoje cada vez que podemos nos encontrar é incrivelmente valioso e importante pra mim. Reencontrar você é enxergar o homem que um dia eu posso chegar a me tornar. Me perdoe, pai.

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