Ímpar
Eu te amo. Digo de uma vez porque já esperei demais para
dizê-lo. Digo sem quase nenhuma certeza. A única que carrego comigo é que não
posso lhe deixar seguir sem saber. Eu o amo, mesmo que não o mereça, mesmo que
já tenha errado demais. E eu não posso deixar que você me deixe sem saber quem
sou.
Agora que você vai sair, eu nem sei. Faz tanto tempo que
você completa as minhas frases, escolhe as minhas camisas, me acorda com o seu
ar, me beija com os lábios afobados, famintos. Faz tanto tempo, que eu nem sei
como é ser ímpar. Parece que nós nascemos em dois. Parece que você sempre
esteve aqui, vigiando a minha falta de jeito com as coisas. E agora você parte
e me reparte em dois.
Um dia, eu encostei em você e me demorei. Um dia, eu
descansei nos seus olhos e adormeci. Foi assim, como adormecer ao contrário,
como viver do avesso, de um jeito confuso, torto e bom. Com você parecia ter
sentido. E agora você sai. Não demora a ir, não me deixa ver você se apagando
como chama miúda, como dia que finda, como criança que desacredita. Não demora
ir, que cada recolhimento teu é uma angústia, um embrulho, uma dor que homem
nenhum no mundo jamais conheceu.
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