Amor primeiro

Querido amor primeiro, depois de tantos anos, hoje, me peguei lembrando de você. Por dois ou três segundos, pude sentir de volta toda a doçura que carreguei ao gostar de ti. Sentir o mundo era mesmo diferente enquanto sentia você. Hoje, às vezes rio do meu próprio destempero, de minhas tentativas amalucadas de me aproximar, de meus medos mais bobos, mas lembro de tudo também com a saudade de quem sabe que provavelmente não sentirá algo tão puro por dentro de novo.

Há tempos não sentia meu coração salteado, os amores de hoje, claro, têm sua beleza, uma beleza tranquila que aprendi a adorar. Mas é tão bom relembrar que o nome de alguém tinha poderes mágicos sobre cada pelo do meu corpo, cada fase da minha pele, cada pensamento meu. Algum dia pertencerei outra vez a alguém assim? Não sei se isso seria saudável na idade que tenho hoje, mas de fato foi muito bom ser todo teu.

Querido amor primeiro, por muitos anos fantasiei que um dia, nos caminhos entrantes da estrada que é viva, nos reencontraríamos cheios de novos aprendizados. E aproveitaríamos esse amor que foi quase sonho para viver algo real. E nos preencheríamos da cumplicidade que temos, de nossos segredos das crianças que ainda éramos, recuperaríamos tudo isso de volta como quem colhe frutos, empilhando-os entre o peito e os braços. É, talvez eu ainda fantasie. Talvez algo que de mim ainda acredite. Há dias, como hoje, em que acredito mais.

Você aprenderia a amar o que me tornei? Acharia bonitos meus olhos cansados, insones, preocupados de ser gente grande? Enxergaria aquele adolescente bobo nas esquinas do meu riso sarcástico? Você se apaixonaria por mim outra vez ou pela primeira vez uma vez mais? Querido primeiro amor, nem todos os caminhos podem ser retomados. Há estradas que só existem para serem lembradas como possíveis, sem as trilharmos por inteiras. De qualquer forma, gosto de lembrá-lo. De levá-lo comigo. De acessar outra vez a chama que meus olhos só tinham quando te olhavam, aquecidos.

Há algo guardado no fundo do mundo que é só nosso, foi dito baixinho, no quase escuro e estará sempre guardado com o garoto que você conheceu anos atrás. Segue ele comigo: o garoto que você conheceu e os segredos que a ele foram dados.

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