Intento

Há uma canção antiga que adoro. Chama-se Ugana-lê. Os povos de algumas tribos africanas a cantam para suas crianças quando querem acalmá-las. A letra fala sobre uma árvore que cresce primeiro para baixo, depois para o céu, tornando-se forte por dentro. Mas o que sempre me encantou, mais do que sua letra adorável, foi o fato de que ugana-lê só pode ser cantada baixinho, na altura do espírito, como me ensinou Iana.

Quando estive com os índios Krahô, um indiozinho mais novo me disse que eu precisava ouvir a história do dia em que a lua sentou no chão com os homens. Pedi que ele me contasse – Não sei contar – respondeu rindo envergonhado – Mas você nunca ouviu a história? – indaguei deixando-o sério – Muitas vezes. Eu sei a história, mas não sei contar.

Precisei passar pela mesma situação mais de uma vez para compreendê-la. É de nossa natureza a teimosia de ver, mas não enxergar. De entender, mas não aceitar. De intelectualizar, sem aprender. A intenção é sempre mais forte que a própria palavra. A palavra vem da cabeça, a intenção vem do espírito. A palavra é prima do ego, a intenção é filha do coração.

Sempre que for fazer algo, até mesmo o mais simples, faça com tudo de si ali presente. Faça com intenção e as mãos cheias de verdade. As palavras mais duras podem vir preenchidas de amor, bem como as letras mais lindas, podem estar carregadas de amargura. Aprenda a canção que diz baixinho que somos mais fortes quando fortes por dentro. Que preenchidos de intenção por dentro, somos intento.

Quando finalmente encontrei alguém que me pudesse contar a história do dia em que a lua sentou-se com os homens, perguntei – Sobre o que eles conversaram? – ao qual o índio com seu cachimbo respondeu sorrindo – Sobre coisa nenhuma. Quando a lua encosta na gente, ela não fala nada, só sente e a gente sente de volta.

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