Até Você Nos Deixar

Tínhamos o dia a dia posto à mesa. Uma normalidade servida em abundância, como frutas da estação. Tínhamos dias bons em que nos fazíamos rir e noites terríveis em que a mágoa vinha se sentar. Tínhamos as tardes em que descobríamos algo deliciosamente novo sobre o outro, ébrios pela preguiça, e noites em que nos perdíamos como se jamais fôssemos nos reencontrar. Ainda assim, tínhamos um ao outro. Tínhamos um ao outro, até você nos deixar.

Foi tentando entender sua falta que percebi que não era só você que me faltava. Me faltava quilometragem, me faltava risco, faltava a mim vastamente. Faltavam-me sabores que só existem em um país mais longe, faltavam-me sons de um instrumento sem nome, faltava-me ser sozinha sem desespero ao menos uma vez na vida.

Deixar-me me fez ir por aí. Precisei ser dor para ser forte, ser o atordoo para encontrar Norte, precisei me ver diminuída segundos antes de finalmente crescer. Até você nos deixar, te amar era tudo o que eu tinha, tudo o que eu era. E mesmo para um amor tão grande, em resumo era pouco demais para que eu só o fosse. Precisei ser destruída em miúdas partes para entender que a gente não completa ninguém o fazendo carregar nossas incompletudes.



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